Estou cansado de tratar neste blog sobre assuntos que me aparecem em sua maioria, vindos do universo paralelo do acaso. Sério, cerca de 95% do que é tratado aqui, praticamente é jogado nas minhas fuças, tal qual marido fedorento e machista que, ao chegar do trabalho, lança sua camisa suada nas ventas da mulher e diz “Lava essa merda, porra!”. Pois é, as mãos insanas da serendipidade me maltratam como uma vadia pungente.
É raro pensar em um assunto, uma pauta crível, contemporânea, que traga mais leitores para esta joça virtual. Admito, sou inepto neste quesito, e é motivo de incômodo. Tenho que deixar para trás essa mania, de que existe uma mágica da casualidade, de musa inspiradora cheia de brilho imaginativo irrigando o jardim da mente. Ponho um fim nisso ou meu futuro na escrita está fadado à mediocridade.
Um antigo e imbecil professor de português da faculdade, um dia cuspia com sua boca cheia de dentes e barba: “Jornalismo é técnica, só isso. Jornalismo não é inspiração!”. Ah, aquele velho filha da puta estúpido pra caralho me fez desistir da matéria na época, tanta era a raiva que tive, quando ele disse essa troça.
Hoje, passado o tempo, depois que os primeiros pêlos pubianos brancos começaram a brotar, percebo que ele estava (preste bem atenção), parcialmente, eu disse parcialmente... Certo.
Deve existir a técnica, sim. Mas não só ela. Escrever só pela técnica te torna um robô cagador de leads. Tem que haver o acaso, tem que se deixar levar por suas torrentes, mas com a velha bóia da técnica para não se afogar no mar do imprevisível.
Toda essa punheta mental que seus olhos acabaram de engolir, foi apenas uma introdução para a defesa desse pensamento sobra casualidade, que me pegou, quase me afogando, caso não fosse o bote da técnica.
Fazendo uma playlist do trompetista Chet Baker, me deparo com esse vídeo maravilhoso. Ele, sua voz macia, cantando o clássico “Time After Time” sem um dos incisivos, o dente da frente, na parte superior.
Há muito tempo o vi em fotos, já velho e com a boca murcha, devido as constantes brigas com traficantes e drogas, mas nunca um vídeo quando jovem.
Que coisa linda!
Tentando juntar um pensamento ao outro, decidi que não iria postar simplesmente o vídeo aqui no blog, com uma legenda tola e frívola, o que me fez escrever sobre tudo, menos sobre a cena. Então, parei, me concentrei alguns segundos, assisti umas duas vezes e mandei:
“Ouvir Chet Baker dá vontade de chorar, de sorrir, de beber algo forte e que nos dope na hora. Faz nascer uma vontade incrível de casar ao seu som e se jogar da ponte ao entardecer por um amor não correspondido.
Ouvir seu trompete é ser transportado para um mundo nada fantasioso, em que dor e prazer se revezam para mostrar ao espírito humano que viver é automaticamente morrer.
Ouvir seu sussurro cantado é aprender qual a trilha perfeita para sugar lábios de olhos abertos, enquanto os corações batem em compasso. Sua voz sem dentes dá regularidade no andamento de uma execução musical feita pelo próprio corpo.
Nunca foi tão cool ser um banguela. Nunca foi tão elegante ser um desdentado. Nunca foi tão requintado afundar-se na lama, enfiar o pé na jaca, cair bêbado de loucura e dizer: “Vez após vez/você vai me ouvir falar/que sou um sortudo por te amar”. Tudo bastante desprezível, mas com muito estilo e doçura.
Olhe o horizonte com Chet Baker nos ouvidos e talvez entenda o que digo. Ele é um ídolo tresloucado que todo o mundo deveria aprender a amar! “