Um monstro chamado dom

quinta-feira, outubro 15, 2009




Total Recall (O vingador do futuro) é um filme de ficção científica, dirigido por Paul Verhoeven. com roteiro baseado na história We Can Remember It for You Wholesale, de Philip K. Dick. No ano de 2084, o operário Douglas Quaid, sem dinheiro para viajar, faz um implante de memória. Compra lembranças de um lugar que nunca foi. Passa a ser perseguido por visões de Marte, resolvendo ir até lá para conseguir respostas. Ao chegar no mundo vermelho, une-se a um grupo de rebeldes que lutam contra uma corporação que quer dominar o planeta. 


Muito bem, não é lá um bom filme que mereça indicações de cult. Particularmente, eu gosto, apesar de ser uma tosqueira trash-cientifica, mas que na época de lançamento, brilhou com seus efeitos sofisticados.Mas enfim, o filme nada tem relacionado com o que pretendo com esse post. Na verdade, seus olhos estão prestes a ler uma pequena análise sobre vocação e satisfação. Essa parte ai de cima só serve para ambientar.


Primeiramente, efemeridade: O crescimento vertiginoso de meu estômago, que perturba a mente, que alimentam minhas reflexões e que me dá as boas vindas ao mundo da “balzaquianidade” sem volta. Em outras palavras: O tempo está ‘abaulando’ meu estômago.

O tempo ou a soma de trabalho sentado + as horas de ociosidade. A fome, filha minha que se desenvolve tão rápida e invisível dentro do ventre, toma formas estúpidas. E de repente, voa em meus pensamentos, preocupações nunca antes tidas: regime, balança, falta de fôlego.

Certo, e o Vingador do Futuro?

Bem, antes deixa eu só te falar mais uma coisa: Nas ruas, pessoas nunca mais vistas me encontram e dizem: “Oi”, “Olá”. Depois complementam com o já previsível “Mas que baita pança, hein?”. Suas línguas bífidas me fazem refletir: Só mesmo os reencontros para acentuar olhares assustados. Os reencontros, as pessoas e seus dedos em riste apontando meu pequeno monstro.

E é desse meu “monstro pessoal” que tento construir um paralelo muito do capenga com o filme em questão.

Arnold Schwarzenegger é Douglas Quaid. Ou é Hauser? Acho que é os dois, pois tem a memória substituída por outra ou coisa que o valha. É uma parada que com certeza brotou dos sonhos químicos do K.Dick. Enfim, eu ia dizendo que Arnold Schwarzenegger é Douglas Quaid e procura o líder dos rebeldes. Um tal Kuato, que nunca aparece e que até mesmo sua existência duvidosa, é considerada quase que uma lenda. Só que o velho Schwarza consegue encontrar no planeta Marte o líder rebelde, o tal Kuato. Mas o líder não era um homem, mas sim um estranho ser, que vivia dentro de outro homem, o qual usava seu corpo como hospede.

Então, acho que tenho um Kuato por trás do umbigo!

Acho que minha barriga vive de forma independente. Tem uma rotina própria. Está em atividade enquanto durmo. Tem sua própria opinião formada sobre tudo. Acho que há um sono sobrenatural que pesa nas pálpebras. Acho que respiro pouco. O efeito Peter Pan se desfaz. Tudo culpa desse meu Kuato pessoal.

Pode ser uma preocupação boba. Se comparado a outras pessoas, ainda continuo magro ou no mínimo, esbelto. Mas o problema é que nunca fui gordo. Para ser preciso, foram 29 anos sem nunca ultrapassar os 56/57kg. Nesse momento, 71kg estão sobre essa cadeira de plástico. Um polichinelo de 05 minutos me faz quase desmaiar. Flexões me dão vontade de morte. Corridas me fazem ver estrelas. O ar falta-me sempre.

O que há de errado com meu coração? Uma crônica e inenarrável hipocondria de velhice? “Rabugências” da idade? Reclamações do que?

No meu quarto, um pôster moldurado do Homem-Aranha, comprado no cinema, como parte de um combo promocional gigantesco de pipoca. E é ali que está a resposta:

O Peter Parker descobriu: “Grandes poderes, grandes responsabilidades”. Acrescentaria: “Grandes poderes, grandes responsabilidades... Grandes conseqüências”. Depois de mais de 12 anos de trabalhos enfadonhos e ‘fordescos’ em que nunca, mas nunca me senti feliz, estou livre, finalmente, para as letras.

O primeiro salário que nasceu não do meu suor, mas de meus dedos, das minhas próprias palavras. O caminho aberto para a escrita. Conseqüências: Fim do bom físico. Portões do fôlego travados. Prisões para a boa saúde em inauguração. Grávido de comida. Grávido de uma rotina sem exercícios. Grávido por passar horas sentado, alternando entre o escrever e o comer.

Mas quer saber? Mediocremente feliz. Estou grávido simplesmente daquilo que eu sempre quis fazer.

Não foi Aristóteles que dizia que um dos maiores desastres humanos é trair o próprio dom? Bom, mesmo que não tenha sido ele, é uma verdade do caralho!