Foto do dia: A man begs on a busy walkway

segunda-feira, outubro 19, 2009

Photograph: Ed Jones/AFP/Getty Images



Na correria do dia a dia, todos misturam-se a todos. Uma confusão de vidas como fluxos de água vindas de todas as partes. No meio do turbilhão, um mendigo é o alvo de um momento único, que somente o olho perspicaz poderia eternizar.

A pergunta é: o que esse homem fez para estar na condição de pedinte? Ou seria melhor, o que ele não fez em sua vida? Acredito que o melhor a fazer é não julgar. Ou se quiser, tentar ajudar. Ou apenas observar a pintura trágica do cotidiano.

Em algum bairro populoso de Hong Kong, na não menos populosa China.

Gonzo The Life and Work of Dr. Hunter S Thompson


Sempre pretendemos ser algo que não podemos ser. Nunca satisfeitos com aquilo que somos, nos deslumbramos com vivências extraordinárias, que extrapolam a forma usual de estar na vida. Talvez por isso, encarnamos mentalmente nossos heróis preferidos nos filmes, na literatura, nos quadrinhos, etc. Eles são tudo o que nós queríamos, mas nunca tivemos coragem. Ou oportunidade, quem sabe.



Este é um documentário sobre uma figura polêmica do jornalismo americano. Hunter Stockton Thompson (1937-2005), ficou famoso pelo seu romance "Fear and Loathing in Las Vegas", transformado no filme "Medo e Delírio", que teve a figura de Johnny Depp como seu fiel representante.



A Hunter é creditado a criação do termo "Gonzo Journalism" – o que alguns definem como jornalismo bizarro, ou ainda subjetivo e fictício. No fundo, trata-se de uma ramificação do “New Journalism”, um estilo no qual o repórter envolve-se de tal maneira na reportagem que ele acaba se tornando a figura central da história.


Sempre como "free lance", cursou sua carreira regada a todo tipo de droga, na qual atacou de maneira irônica, tudo e todos. Podemos ver um Hunter em seu auge profissional, entre os anos de 1965 a 1975, com imagens nunca vistas antes.



Hunter S. Thompson é, em minha vida, um grande herói. Impossível de segui-lo, impossível de ser tão genialmente avesso às regras como ele foi e principalmente, impossível de consumir tão visceralmente a quantidade de álcool e drogas que consumia em favor da sua obra escrita.



Fez dessa loucura criativa e imoral, a força motora para ser a tampa de refrigerante que arranha a pintura aparentemente perfeita do carro do hipócrita sonho americano, revelando por baixo da tinta, a lataria enferrujada de um sistema corroído por guerras, corrupção e poder a qualquer custo. Um herói que tinha dentro de si seu pior inimigo. O único homem que poderia dar cabo de sua vida. A única mão capaz de matar tudo aquilo que construiu.



É difícil ser como ele. É preciso um desapego e uma vontade de morte sem precedentes. Sim, vontade de morte. Quando não se teme a morte, tudo é possível. Durante todo o documentário, mostra-se que Hunter sempre teve apego ao suicídio. Era algo certo em sua vida. Era só uma questão de tempo. Ele queria perpetuar-se. Queria falar da morte da forma como sempre falou em seus artigos: vivendo-os. E com a morte não seria diferente. Necessitava encontra-la no momento perfeito, exatamente quando tudo estava calmo em sua vida.


Comparo-o a um samurai.


Na filosofia do Bushido, o código de honra Samurai, a morte era um meio de perpetuar a existência. A vontade de morte era justamente o que aumentava a eficiência e a não-hesitação em campos de batalha, o que veio a tornar a figura do samurai algo como o mais letal de todos os guerreiros da antiguidade.



No clássico livro samurai “Hagakure”, Yamamoto Tsunetomo fala sobre um termo peculiar, o ‘Shinigurai”. É uma expressão japonesa que significa “estar louco para morrer”, no sentido de saltar nas garras da morte sem hesitação. E exatamente isso que Hunter foi: Um homem sem hesitações. Sem medo de escrever o que queria, sem deixar de criticar o que odiava, não deixando passar por essa vida medíocre sem fazer um barulho dos infernos necessário.



Em meio a um mundo de rebeldias de playground, em que jovens se alienam em músicas insípidas e sem vigor, consumindo tecnologia de ponta e sendo parte de uma grande aldeia global tecnologicamente conectada e que não serve para absolutamente nada, para quê viver? Para quem gritar? Quem gostaria de acordar desse sonho agradável e confortável com recursos touchscreen?



Cansado disso tudo, Hunter S. Thompson pediu para parar o mundo, pois queria apenas descer.