Ao
sabor de uma brisa quente em plena noite, desço do ônibus. Indo para casa. Uma
caminhada de dez minutos através de ruas, pessoas e objetos suburbanos dignos
do rótulo Cyberpunk. Uma precária iluminação com suas enormes e pontiagudas
silhuetas negras, dáo toque sombrio. O cheiro das descargas de chaminés do
conglomerado petroquímico, a menos de 10Km de distancia, dá o cheiro grotesco a
cena. Fábricas de negro-fumo, industrias de benzeno, derivados fétidos de
celulose. Um pequeno exemplar de inferno sintético para evitarmos futuros
pecados.
Como sempre, tenho nos ouvidos um universo
sonoro que me separa do que vejo. Como que protegido por uma bolha (de sons,
pensamentos, ícones obscuros da industria cultural), que não me contamina com a
rua viva, pulsante, rápida. Um vírus correndo e corroendo rápido por dentro das
veias apodrecidas de uma cidade doente.
Mas isso não é ficção cientifica.
Está é a realidade onde fetiches e obsessões
surgem ao comando de um deus que projeta novos prazeres para almas vazias e
ávidas por sentido. E nessa realidade esse deus inventou felicidades vãs que se
esvaem tão velozes como uma gota de éter que se dissipa ao pingar no chão. Uma
de suas grandes criações são os paraísos artificiais. Líquido, pó ou fumaça:
muitos são os portões que levam à simulações de mundos de estados perfeitos da
mente. Aqui e ali, pequenos grupos, recostados em muros com muitas estórias,
sorvem discretamente os diversos meios de chegar a Shagri-La. A primeira viagem
virtual de boas sensações da humanidade.
Ao longo do caminho, uma outra criação: o ardor
por corpos que expelem desejo. Doze, treze, quatorze, quinze anos. Aprendizes
de luxuria em roupas mínimas que destacam seus corpos inflados de hormônios
mutantes. Meninas que conheceram o desejo através de músicas onde a
sensualidade hipnotiza sob a influencia de antigos toques de tambores advindos
da mãe-áfrica. Pequenas usuárias da diversão de corpos, que necessitam do
prazer como força dominadora. E a rua está cheia delas.
E nas ruas também estão as necessidades que não
precisamos . São representados pelos grandes bocados de lixo, banquete dos cães
pulguentos. Um manjar para seus estômagos dilacerados pela fome. Servem-se
também aqueles que transformam caixas de tv´s LCD em dinheiro. Emprego sem
chefe e sem horário. Recicladores de objetos urbanos. Inconscientemente, têm na
mente a certeza que toda grande novidade, toda grande novidade da moda,
qualquer tecnologia de ponta, um dia, estará em qualquer esquina.
Um dia será lixo.
E assim caminho entre aqueles que consomem um
mundo de terceiro mundo. Carne, I-phone, grifes. Churrasquinho de gato, Mp9,
óculos clones vendidos nas praias. Uma versão pobre e suja de um mundo que
desponta para um futuro informacional sem precedentes. Aqui, o futuro está nas
mãos de um camelô.
Um comentário:
D-E-N-S-O.
O futuro é o mesmo que você já viu no passado e assim, repete-se ciclicamente em um turno atemporal e ilusório.
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